Cientistas Brasileiros Advertem Que O Pantanal, Uma Das Maiores Áreas Umidas Do Mundo, Está Em Risco De Colapso

May 5, 2022

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Considerado um modelo de uso sustentável da terra, os cientistas alertam o mundo para "a tragédia do comuns" que aflige o Pantanal um dos ecossistemas mais biodiversos da Terra

Nova York, NY - De acordo com uma carta publicada hoje na BioScience o Pantanal, uma das maiores áreas umidas do mundo,  está em risco de colapso devido a uma série de decisões locais e aparentemente menores que não respondem por seu impacto cumulativo em um dos ecossistemas mais biodiversos da Terra. Os autores da carta, “The tragedy of the commons: How subtle and "legal" decisions threaten one of the largest wetlands in the world,”  incluem cientistas da Panthera, organização global para conservação de felinos selvagens, Embrapa Pantanal, IPÊ, Instituto Smithsonian de Biologia da Conservação e CENAP/ICMBio. 

Abrangendo mais de 179.000 km2 no Brasil, Paraguai e Bolívia, o Pantanal apresenta uma das maiores concentração de flora e fauna da América do Sul, servindo como um dos modelos de maior sucesso do planeta para o uso sustentável de um conjunto de recursos comuns. A maior parte de suas terras é utilizada para a pecuária tradicional e a pesca pelas comunidades locais e pescadores esportivos, com relativamente pouco impacto em seus ecossistemas. É designada Patrimônio Nacional pela Constituição Brasileira e uma região de uso restrito, cujo uso deve ser ecologicamente sustentável. 

Na carta, os cientistas citam uma perigosa escalada durante as duas últimas décadas nas decisões e propostas de uso do solo feitas localmente e legalmente, para abrir o Pantanal a usos mais intensivos que coletivamente ameaçam a sobrevivência a longo prazo do Pantanal. 

"Ainda há esperança para o Pantanal, mas seu uso sustentável não deve ser desafiado pelas conseqüências de pequenas decisões equivocadas que não consideram seus impactos cumulativos, comprometendo o futuro da pecuária sustentável, da pesca, do ecoturismo, das comunidades tradicionais, da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos", advertem os cientistas na carta. 

Há vinte anos, um grupo de cientistas liderado pelo Dr. J.F. Gottgens fez um alerta inicial em um artigo publicado na BioScience. O relatório advertia que os interesses individuais e locais são prejudiciais aos interesses coletivos da conservação do Pantanal, comparando a situação com a "tragédia dos comuns" ou a "tirania das pequenas decisões". 
Duas décadas depois, cientistas afirmam que a previsão de Gottgens se tornou uma realidade. Eles citam a aprovação de um número crescente de usinas hidrelétricas nas bacias hidrográficas que formam as áreas úmidas do Pantanal, o que pode causar mudanças significativas na hidrologia e na entrada de nutrientes nos ecossistemas. 

Mais recentemente, a construção do porto Barranco Vermelho no rio Paraguai recebeu aprovação preliminar do Conselho do Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso em janeiro de 2022. O licenciamento levou em conta apenas as conseqüências locais do empreendimento sem considerar que este porto só seria viável se uma hidrovia projetada fosse implementada para o sul no rio Paraguai. A hidrovia pode representar uma ameaça substancial para o Pantanal devido ao seu potencial de influenciar negativamente a assinatura hidrológica do ecossistema.

Segundo os autores, as sinergias entre as diferentes ameaças podem causar profundas consequências geográficas, ecológicas e sociais. As ameaças ao Pantanal também vão desde a mudança climática em escala global até o desmatamento na Floresta Amazônica, que serve como origem das chuvas que fazem do Pantanal um pântano, até a seca severa e os incêndios de grandes proporções. Estima-se que pelo menos 17 milhões de vertebrados tenham sido mortos imediatamente pelos incêndios que queimaram um quarto do Pantanal brasileiro em 2020, segundo um estudo de 2021 da Rede Mogu Mata, coordenado pela Embrapa Pantanal e ICMBio/CENAP em colaboração com a Panthera. 

Rafael Morais Chiaravalloti do IPÊ e do Instituto Smithsonian declarou: "Estamos testemunhando a " cupinização " do Pantanal, semelhante aos efeitos de um ataque de cupins sobre um pedaço de madeira. Estão sendo feitos pequenos buracos generalizados que não são perceptíveis apenas olhando de fora. Se não tomarmos conta deles, eles se tornam tão numerosos que podem levar o Pantanal ao colapso". 

O pesquisador da Panthera, Fernando Tortato declarou: "O Pantanal é um ecossistema onde a extensão e a duração das cheias sazonais são vitais para manter a biodiversidade, a pecuária tradicional e os recursos utilizados pelas comunidades locais. Estamos testemunhando uma convergência de ameaças que podem levar ao desaparecimento do Pantanal como o conhecemos hoje".

"Essas ações cumulativas podem levar ao colapso não só do Pantanal como também de um dos maiores e mais belos exemplos de sustentabilidade do mundo", concluiu Chiaravalloti. 

Panthera atua no Pantanal desde 2008 através do Projeto Onças-pintadas, que visa criar um dos maiores corredores contíguos para onça-pintada do mundo. Na Fazenda Jofre Velho, sua base de pesquisas, estuda e testa estratégias anti-depredação para mitigar o conflito entre homem e onça-pintada, atua no desenvolvimento sustentável da próspera indústria de ecoturismo e desenvolve iniciativas de educação para a conservação através da Escola Jofre Velho. 

Sobre a Panthera
Panthera, fundada em 2006, dedica-se exclusivamente à preservação de felinos selvagens e seu papel crítico nos ecossistemas do mundo. Os principais biólogos, especialistas em aplicação da lei e defensores dos felinos selvagens de Panthera desenvolvem estratégias inovadoras baseadas na melhor ciência disponível para proteger guepardos, onças, leopardos, leões, pumas, leopardos da neve, tigres e as 33 espécies de pequenos felinos e suas vastas paisagens. Em 39 países ao redor do mundo, a Panthera trabalha com uma grande variedade de parceiros para reduzir ou eliminar as ameaças mais urgentes aos felinos selvagens, garantindo seu futuro e o nosso. Visite panthera.org.